Laticínios brasileiros querem medidas do governo para enxugar o mercado e aliviar a pressão sobre os preços internos de leite e derivados. Representantes do setor reclamam de sobreoferta e da concorrência com o produto importado, mas competitivo e mais barato. A indústria de lácteos pede que o governo compre 50 mil toneladas de leite em pó e 400 milhões de litros de UHT, que poderiam ter como destino a merenda escolar e programas sociais. Lideranças disseram a Globo Rural não ter recebido uma resposta de Brasília.

 

Além das compras governamentais, laticínios brasileiros defendem mais restrições às importações. O Ministério da Agricultura apoia a medida, sobre a qual a decisão passa pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.

 

“A ideia é de que o governo faça uma compra imediata ou pelo menos dê uma sinalização ao mercado”, resume o secretário executivo do Sindicato dos Laticínios do Rio Grande do Sul (Sindilat), Darlan Palharini. A conta apresentada pelo setor ao governo não é pequena. A considerar os volumes propostos e os preços de referência utilizados para reivindicar as aquisições oficiais – R$ 14,30 o quilo de leite em pó e R$ 2,21 o litro do UHT – o valor fica perto de R$ 1,6 bilhão. “Esse seria o mundo perfeito”, diz o representante dos laticínios gaúchos. “Se for olhar isoladamente, é um valor considerável, mas, dividindo por Estado, não é nada assustador”, argumenta.

 

No início deste mês, lideranças da indústria se reuniram com ministros e representantes de órgãos do governo federal. A Casa Civil delegou aos Ministérios do Desenvolvimento Social (MDS) e da Agricultura (Mapa) a análise da situação. Entre o que quer o setor e o que talvez seja possível, a distância pode ser grande. Às voltas com o ajuste das suas próprias contas e com a necessidade de promover a retomada da atividade econômica, a dificuldade maior é exatamente de onde tirar o dinheiro nas atuais condições. Não há prazo para tomar uma decisão.

 

“A proposta do setor ficou para os ministérios. A questão é como resolver. É um valor bem alto, uma questão de alto vulto, tem que tratar com responsabilidade”, diz o secretário nacional de Segurança Alimentar e Nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social, Caio Rocha. Em Goiás, a preocupação é que uma eventual aquisição por parte do governo seja limitada a poucos fornecedores. Alfredo Luiz Correia, diretor executivo do Sindicato das Indústrias de Laticínios do Estado (Sindileite), defende que médios e grandes produtores possam também participar. “O governo tem que entrar para regular o mercado porque o problema é nacional, não só do produtor familiar. A aquisição tem que ser feita de produtores de todos os tamanhos”, diz Correia, afirmando esse assunto ainda está em debate entre representantes do setor.

 

Mas o Ministério da Agricultura é taxativo. O secretário de Política Agrícola, Neri Geller, avalia ser possível executar as compras apenas no âmbito dos programas sociais. O governo não tem estrutura para estocar grandes volumes de leite e derivados. “Não há como fazer isso. Mesmo se for leite em pó, como vamos fazer a manutenção disso? Agora, o mecanismo do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) e aquisição para distribuição, estamos trabalhando o orçamento. Vamos fazer o que for factível”, diz.

 

Importações

Diante do excedente interno que pressiona os preços, a opção mais viável é limitar importações, pelo menos na visão do Ministério da Agricultura. Para Neri Geller, a concorrência com o produto do exterior é o principal problema a ser atacado para tentar reequilibrar o quadro de oferta e demanda do setor lácteo brasileiro. Uma medida neste sentido também atenderia a demanda dos laticínios. A indústria reclama, principalmente, da entrada do produto do Uruguai. Mais competitivo, o leite em pó do país vizinho chega a valores mais baixos, impondo uma paridade ao produto nacional.

 

Representantes dos laticínios dizem que esse movimento acontece mesmo quando as importações diminuem, como vem ocorrendo neste ano. No primeiro semestre, o Brasil comprou do Uruguai 17,9 mil toneladas de leite em pó. Entre janeiro e junho do ano passado, foram 30,3 mil toneladas. Palharini, do Rio Grande do Sul, explica que o leite em pó uruguaio é comprado atualmente a R$ 10,50 o quilo. O brasileiro custa em torno de R$ 12. Meses atrás, a cotação interna estava superior a R$ 14 o quilo. “O que chama a atenção é que as importações de leite em pó vem caindo, mas de outros derivados, como queijo e soro, estão aumentando”, preocupa-se o secretário executivo do Sindilat do Rio Grande do Sul.

 

Ele defende o estabelecimento de uma cota de importação de todos os derivados fornecidos pelo Uruguai. Uma eventual sanção seria mais rigorosa do que a aplicada à Argentina, cujo limite vale só para o leite em pó. Havendo sucesso com os uruguaios, diz ele, a ideia seria retomar a discussão e elevar as restrições também aos argentinos. O secretário de Política Agrícola, Neri Geller, reforça tese já defendida pelo próprio ministro Blairo Maggi. Entende que o leite deve ser retirado da pauta do Mercosul. “Não é vedar a importação, mas criar mecanismos para a concorrência não ser desleal. Temos conversado porque o problema do leite é grave e não podemos desarticular o setor porque recuperar é muito difícil.” A discussão passa pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), que chegou a propor a criação de um grupo de trabalho para tratar do assunto, inclusive, com o Uruguai. Procurado, o MDIC não deu uma resposta até a conclusão desta reportagem.

 

Fonte: Globo Rural